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sexta-feira, 27 de abril de 2012

* Duas cerejas *


                                                           ANOITECER

  
Estava eu a percorrer um pequeno caminho do bar a praia afim de dar uma pausa em minha caminhada para casa.Havia tomado algumas doses de cachaça barata , daquelas que você só compra por conta do preço diminuto e ingere apenas com o intuito de embriagar-se. O trajeto era curto , como eu mesmo a pouco mencionara , os passos dados por mim estavam em completo zigue-zague  e meus sentidos que outrora sempre me direcionavam a meus objetivos de maneira linear apenas estavam a me confundir.
Se vos dissesse que estava como um bêbado a minguar estaria mentindo, estava de uma forma bem peculiar , como se minha sensibilidade estivesse aflorado a tal ponto que tudo ao meu redor criasse vida, fitava a natureza de uma maneira exacerbadamente poética . A noite exibia seu espetáculo gratuito , as estrelas ao longe mais pareciam pontos luminosos , permaneciam aos montes , de uma maneira que não podia-se quantificar claramente a quantidade que se via a olho nu. O conjunto de elementos que se combinavam ali me passavam uma sensação inédita, a de que eu estivesse presente em uma obra de arte impressionista ,pois as luzes e cores em um tom turvo davam uma atmosfera excepcional a noite. Sim , isso mesmo, não era loucura! E se talvez fosse, que permanecesse assim. 
Próximo a beira do mar resolvi sentar numa areia mais fofa, aconchegante, para que posteriormente pudesse fitar o movimento rítmico causado pela maré, esta que me tragava lentamente ,como se de alguma maneira estivesse me convidando para uma valsa. Aquelas águas cristalinas não me enganavam, sabia muito bem qual eram seus reais intuitos, queriam me afogar em suas cruéis correntezas, assim como fizera com tantos outros ébrios solitários que se perdiam ao se ludibriarem com suas belezas impares. 

                                                          AMANHECER



Durante longo tempo permaneci a admirar a noite sem me dar conta de algo, não havia notado que próximo a mim havia uma bela garota que trajava um lindo vestido branco e que, assim como eu,  também fitava o céu estrelado. Observei-a por algumas horas, sem notar o tempo que passava e ela mesmo assim não havia evidenciado minha presença, de maneira alguma. Resolvi aproximar-me lentamente, meu sentimento de solidão gritava através de meus sentidos para que me aproximasse da jovem, queria poder desfrutar daquela noite tão singular ao lado daquela desconhecida. Andei então em passos forçados até sua singela figura, sentei-me ao seu lado e ela olhou-me assustada, seus olhos eram os olhos mais belos que já havia visto em toda a minha vida, neles tinham algo que nunca outrora vira de maneira tão expressiva:VIDA!
 Apesar de exprimirem um certo medo eles escancaravam uma vivacidade incrível. Olhei-a também, e me encantei cada vez mais com a beleza que possuia, sua pele era alva como neve, contrastando com toda aquela areia, seus lábios eram grandes e estavam pintados de vermelho, assim como a tatuagem que avistara por acaso em seu ombro, era bem característica .Disse então que não queria incomodar, apenas queria sentar-me ao seu lado e junto com ela olhar as estrelas. A garota hesitou um pouco, mas depois agiu de maneira permissiva.
Após olharmos a paisagem, ela me dissera uma coisa...
Disse-me num tom triste, que sempre sentia-se muito pequena quando olhava a imensidão do céu e o mar ao horizonte, que apesar de lhe trazer uma felicidade momentânea, tudo aquilo lhe trazia uma sensação de melancolia,pois sentia-se só diante das circunstâncias. Então,após olhar em meus olhos com uma certa ternura,ela inesperadamente resolvera tomar-me a mão, pedindo-me que eu não a soltasse pois assim o sentimento de solidão voltaria a lhe atormentar. Pedira-me também que eu ficasse em sua companhia até o amanhecer e eu,logicamente, não negara o pedido, segurara sua mão com força e colocara sobre o meu peito.  
Logo após isso nos deitamos e continuamos a olhar o céu...
Acabando por dormir nós dois, ali mesmo e quando abrira os olhos, que começaram a lacrimejar com um certo ardor, o crepúsculo já havia findado, trazendo consigo o dia, levando as estrelas e por fim a garota que dormira ao meu lado.
Levantei-me cabisbaixo e fitei o horizonte como se fosse a última vez, o Sol brilhava sobre as águas do mar,fazendo com que estas refletissem de uma maneira curiosa o céu, dando-me uma sensação de que o próprio mar  havia se fundido a este num ponto infinitamente distante.Sentira um arrepio por todo corpo e confesso que agora sabia,de certa forma, oque era aquela sensação de pequenez que a garota que esteve ao meu lado descrevera diante de tamanho deslumbramento. Não conseguira segurar minhas lágrimas diante de um momento tão ilustre...
Era tudo tão belo!

Após aquele momento e aquela noite irreverentes, resolvi retomar minha caminhada pela praia e distanciando-me daquele local pude recordar-me de uma coisa, a garota tinha duas cerejas tatuadas em seu ombro, poderia reconhece-la se a visse de novo em outros dias.